De onde eu falo sobre a desigualdade que vivemos
- Alexandre Quevedo
- 19 de fev.
- 2 min de leitura
Atualizado: 23 de mai.
O nosso olhar é moldado pelas nossas experiências. Eu acredito que todas as pessoas que vivem no Brasil têm algo a falar sobre a pobreza e a desigualdade que assola a nossa sociedade. Eu sou só mais uma pessoa contando como isso afetou a minha vida e a minha visão do mundo.

Sou de Niterói, cidade que fica há uns 20 minutos do Rio de Janeiro. Quem mora no Rio já está costumado a conviver com a pobreza, não importa a classe social da pessoa, pois há morros com favelas por toda a parte, há mais de 700 favelas na região metropolitana da cidade.
Passei boa parte da minha infância em uma região chamada Maria Paula, fica na divisa com a cidade de São Gonçalo. Na década de 80, Maria Paula era um bairro pobre e mais distante da região central de Niterói. Lá, eu convivi com pessoas que tinham bem menos acessos do que eu, meus amigos da rua, o pessoal que jogava bola. Quase todos eram de uma favela que ficava a menos de 1 km da minha casa.
Quando tinha uns 7 anos, me lembro de observar que tinha gente que vivia em casa sem banheiro, casa de 1 quarto onde moravam mais de 10 pessoas, casa feita de tábua e tijolo, sem acabamento. Me chamava a atenção como os meus amigos gostavam tanto de comer ovo (porque não tinha quase carne na casa deles). Me lembro também de observar como todo mundo achava aquilo normal, dos meus pais às próprias pessoas que viviam nessas condições. A preocupação dos adultos da minha família com relação a esse assunto era se a favela era tranquila ou se tinha tráfico – nessa época o poder paralelo ainda não tinha tomado todos os espaços.
Apesar de, aos poucos, ir compreendendo que era uma aberração a distância entre o que eu tinha de acesso e o que esses amigos tinham de acesso, eu também fui levado a acreditar que a vida era essa e que cada um que seguisse com o seu caminho e o que tem para viver (ou sobreviver).
Alguns anos depois, nos mudamos para um bairro “melhor” - pois a região de Maria Paula começou a ficar perigosa – e eu segui a minha vida como um garoto de classe média que estudou em boas escolas, fez faculdade pública e foi trabalhar com o que escolheu.
Mesmo tendo seguido um caminho longe daquele lugar, eu nunca me esqueci das pessoas, das casas, dos cheiros, de como se vivia naquele lugar de Maria Paula. Essa experiência foi e é, até hoje, parte da minha vida e ajudou a moldar a minha visão do mundo me gerando uma grande inquietude com a desigualdade que vejo a minha volta.
Por trabalhar na área de sustentabilidade e de impacto social há alguns anos, eu acabo estando a todo momento em contato com as desigualdades, seja pelos dados, pelas pessoas com quem convivo, pelas histórias que me tocam, por isso me sinto todos os dias chamado a falar e tratar delas.
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